A lei “anticorrupção”, que deve entrar em vigor até fevereiro, promete ser mais uma fonte de demandas para os executivos, que nos últimos tempos já vinham sentido o maior rigor de órgãos de regulação e da Justiça. O crescente temor de responsabilização de administradores na figura da pessoa física por falhas ocorridas na prática da gestão de companhias tem impulsionado o segmento de seguros de diretores e conselheiros (conhecido como D&O, na sigla em inglês).
O D&O é contratado pelas empresas para proteger o executivo em caso de reclamações de terceiros (seja de regulador, funcionário, fornecedor ou acionista) relacionadas às suas responsabilidades como administrador de empresa, muitas vezes exigindo ressarcimento com o patrimônio pessoal do executivo. A apólice cobre desde custos de defesa até uma “mesada” em caso de bloqueio ou penhora de bens.
O aumento da percepção de risco e o fato de o preço do seguro estar estável – para alguns segmentos apresenta até queda – têm feito as empresas aumentarem o valor de cobertura de suas apólices no momento da renovação. Um levantamento realizado pela empresa de auditoria e consultoria KPMG com 232 empresas de capital aberto mostra que o valor total de cobertura do D&O saltou de R$ 8 bilhões, em 2012, para R$ 11 bilhões, em 2013, alta de 37,5%.
“Há hoje no Brasil um recrudescimento nas formas de fiscalizar e acionar pessoas como administradores. Os órgãos fiscalizadores e o sistema repressivo estão ficando mais ágeis e os tribunais um pouco mais rigorosos”, observa Paulo Baptista, líder da prática de fusões e aquisições da corretora de seguros Marsh Brasil.
No caso específico das empresas abertas, a atuação mais forte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem sido decisiva para o aumento do valor de cobertura das apólices. “É crescente o número de processos instaurados pela CVM, assim como o aumento do valor das multas aplicadas”, diz Adriano Almeida, diretor de produtos financeiros da corretora Aon.
E a “lei anticorrupção” pode adicionar mais complexidade a esse cenário, pois aumenta o temor da chamada penalização por “solidariedade”, em que o executivo pode ser chamado a responder pelos atos de um subordinado e ser considerado culpado por não ter sido diligente no exercício da função. Esse tipo de responsabilização já existe no país, mas ganhou força com o julgamento da ação penal 470, mais conhecida como mensalão.
Nesse caso, a novidade ficou por conta da teoria do “domínio de fato”, utilizada para condenar José Dirceu e José Genoíno. Segundo esse princípio, um executivo deve ter consciência e é responsável pelo que acontece nas esferas mais baixas de decisão. “Mais do que nunca, os executivos têm de estar atentos ao que acontece. ‘Eu não sabia’ não é mais um argumento válido”, diz Sidney Ito, sócio-líder de consultoria em riscos e governança corporativa da KPMG.
A “lei anticorrupção” prevê que as empresas possam ser multadas em até 20% do faturamento bruto caso algum funcionário se envolva em atos de corrupção. Até então, apenas o funcionário público corrompido era passível de punição. A lei permite redução das multas caso a empresa contribua com as investigações de forma ativa e incentive canais de denúncias anônimas. “A expectativa é que as denúncias aumentem, o que redobra a necessidade de proteção por parte da alta diretoria”, reforça Ito.
Os maiores “demandantes” de indenizações do seguro de executivos são os órgão fiscalizadores, como a CVM e o Banco Central (BC). Trata-se de um segmento relativamente pequeno no Brasil, em relação ao tamanho do mercado segurador, mas que tem avançado a passos largos. O volume de indenizações pagas por seguradoras cresceu 228% de janeiro a outubro do ano passado em relação a igual período de 2012, para R$ 38,8 milhões, segundo os dados mais recentes da Susep, órgão regulador do mercado de seguros.
Executivos desse mercado avaliam que tal aumento não é explicado apenas pelo maior rigor dos órgãos fiscalizadores e dos tribunais, mas também porque as empresas e executivos têm aprendido a usar melhor o seguro. “Isso decorre do amadurecimento do mercado, pois agora as empresas sabem que têm apólice e o que ela cobre. No passado, tinha companhia que tinha seguro, mas não o usava”, conta Maurício Bandeira, gerente de linhas financeiras da corretora Aon.
No caso das companhias de capital aberto, uma das maiores motivações para a contratação do seguro são os processos administrativos da CVM, segundo Klaus Barretta, superintendente de D&O da Liberty Seguros. “Os termos de compromissos são praticados desde 1998 e, de lá para cá, já foram realizados mais de 400 acordos, que arrecadaram mais de R$ 100 milhões”, contabiliza o executivo.
E o rigor da autarquia pode ser notado no maior valor dos termos de compromisso celebrados. “Antes os termos começavam em R$ 50 mil, agora são de R$ 100 mil para cima”, observa Ana Albuquerque, gerente de linhas financeiras da Zurich Seguros. Barretta lembra que o maior termo já celebrado foi de R$ 12,2 milhões. Por se tratar de um acordo, e não de uma multa, o seguro cobre esses termos de compromisso até o valor segurado pela apólice.
Outro fator de risco atual é o cenário econômico mais complexo. “Câmbio pressionado, maior endividamento, mais concorrência, fusões e aquisições, tudo isso expõe mais o executivo, que necessita de uma apólice mais adequada a esse contexto”, diz o superintendente da Zurich.
Fonte: Valor Econômico
Att.
Patricia Campos
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