Para se eximir do pagamento do prêmio do seguro de vida, a seguradora não pode alegar doença preexistente se a contratação se deu na modalidade de ‘‘venda casada’’, onde o interesse principal é oferecer financiamento ao cliente, e não averiguar o real estado de saúde naquele momento. Afinal, o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) considera abusiva a prática de condicionar o fornecimento de um serviço à aceitação de outro.
Com esse entendimento, a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reformou sentença para condenar a Aliança do Brasil a pagar indenização aos beneficiários de um segurado que morreu em decorrência de complicações causadas por diabetes — doença da qual já se tratava antes de contratar a apólice. A proposta de seguro estava vinculada à operação de financiamento rural.
Ao contrário do posicionamento da primeira instância, que indeferiu o pagamento do prêmio na alegação de má-fé, o colegiado entendeu que a simples apresentação do formulário com a Declaração de Saúde do contratante — onde este informa não ter problemas de saúde — não é capaz de afastar a responsabilidade da seguradora. Isso porque, havendo ‘‘venda casada’’, a seguradora aceitou as informações que lhe foram prestadas, sem contestá-las, firmando o contrato e recebendo os respectivos prêmios.
‘‘Ainda que admitida a existência de doença anteriormente à contratação do seguro, no caso, tal circunstância não teria o condão de comprovar que o segurado agiu de má-fé ao firmar o contrato’’, registrou, no acórdão, a relatora da Apelação na corte, desembargadora Isabel Dias de Almeida. ‘‘Somente após a ocorrência do sinistro é que a seguradora se preocupou em averiguar o histórico de saúde do segurado’’, emendou.
"Considerando o evidente condicionamento do crédito à contratação do seguro, o consumidor ficou sem nenhuma alternativa, senão consentir com a ‘venda casada’", entendeu a julgadora.
‘‘Saliento, também, que a má-fé não se presume, mas se prova. Diante da falta de prova, a indenização securitária é medida que se impõe, com base no artigo 757 do Código Civil’’, definiu a desembargadora. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 24 de abril.
O caso
Em fins de agosto de 2010, Ari Stramari celebrou um contrato de adesão de seguro de vida com a Companhia de Seguros Aliança do Brasil, prevendo o pagamento de R$ 67.068,19 em caso de morte natural. Em menos de dois meses, dia 18 de outubro, ele morreu. Sua família comunicou o fato à seguradora, cobrando o prêmio do seguro — que foi negado, sob o argumento de doença preexistente.
Com a recusa de pagamento, os sucessores de Ari Stramari resolveram ajuizar Ação Ordinária de Cobrança contra a Aliança do Brasil na Vara Judicial da Comarca de Ronda Alta, para fazer valer os termos do contrato. Alegaram que cabia à seguradora ter solicitado os exames médicos antes de firmar a contratação do seguro.
Citada judicialmente, a Aliança apresentou defesa. Disse que a doença que causou a morte do segurado foi omitida no momento da contratação da apólice. Mencionou que, desde 2002, o contratante fazia tratamento junto ao Hospital Padre Eugênio Medicheschi, com diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica e diabetes insulino-dependente. Os controles inadequados, ao longo dos anos, resultaram em complicações — ‘‘pé diabético’’ e insuficiência arterial periférica.
A peça de defesa ressaltou que, na assinatura da proposta, o contratante declarou que não era portador de qualquer doença que o obrigasse a fazer acompanhamento médico, nem fazia uso de medicamento de forma continuada, além de não ter se submetido a tratamento hospitalar nos últimos três anos.
A sentença
A juíza de Direito Caroline Subtil Elias, em sentença proferida dia 17 de dezembro de 2012, julgou improcedente a demanda ajuizada pelos sucessores, por entender que o segurado agiu de má-fé ao prestar declarações inexatas e omitir fatos no ato de assinatura do termo de proposta.
‘‘A causa mortis do mesmo, conforme certidão de óbito, foi ‘infarto agudo do miocárdio, diabetes melito, cardiopatia isquêmica, hipertensão arterial sistêmica’. Portanto, cristalino que a morte decorreu das doenças que já apresentava muito antes da contratação’’, disse a juíza.
Ela aplicou ao caso as disposições constantes nos artigos 765 e 766 do Código Civil. O primeiro diz: ‘‘O segurado e o segurador são obrigados a guardar, na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes’’. Tal compromisso, assegurou, é o que garante a segurança jurídica do contrato.
O artigo 766, por sua vez, é bem claro na questão da penalidade: ‘‘Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido’’.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
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