CRISTINA MORENO DE CASTRO SAMIA MAZZUCCO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os médicos de São Paulo desaprovam os planos de saúde com que trabalham, acham que eles interferem em sua autonomia e que isso prejudica o atendimento.
Em pesquisa feita pelo Datafolha, a pedido da APM (Associação Paulista de Medicina), a nota média atribuída pelos médicos às operadoras foi de 4,7, de zero a dez.
Mais do que isso, 93% deles afirmaram sentir que há interferência dos planos de saúde em sua autonomia.
Entre as interferências, os médicos dizem que não recebem por procedimentos feitos, que os planos limitam o número de exames e que a burocracia dos planos retarda a internação de pacientes.
"Isso causa grave prejuízo a quem trabalha e à população que gasta recursos para garantir à família um atendimento melhor", diz Jorge Curi, presidente da APM.
A pesquisa ouviu médicos de todas as especialidades. Segundo Curi, "as que exigem maior conversa com o paciente, como pediatria, clínica e obstetrícia, são as mais prejudicadas".
A Amil, sexta maior operadora de SP em total de clientes, é citada como a que mais interfere no trabalho do médico em cinco de sete quesitos (veja quadro).
As entidades médicas cobram da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) que regule os planos para que desburocratizem o atendimento aos pacientes. A ANS não se pronunciou.
Há hoje 17,6 milhões de usuários de planos médicos no Estado. Um terço dos 110 mil médicos do Estado é credenciado em planos de saúde, segundo a APM.
A assistente de vendas Cláudia Tavares, 35, diz que vive um "parto" desde que descobriu um nódulo na tireoide, em abril, que depois se mostrou um tumor maligno. Ela teve problemas com seu plano, o GreenLine.
Cláudia gastou três meses para ser autorizada a fazer a biópsia e mais três semanas para conseguir a cirurgia. Depois, mais um mês para fazer um exame pós-operatório.
Agora, tem 40 dias para iniciar a iodoterapia, mas o plano diz que só poderá fazê-la em março. Cada sessão custa de R$ 5.900 a R$ 7.000. "Ganho abaixo de R$ 1.000 por mês, não tenho condição." Nenhum representante da GreenLine foi localizado.
Restrições são só as previstas, diz federação
A FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde), que tem os planos Medial, Intermédica, Amil (considerados na pesquisa os três piores) e SulAmérica (também citada) como associados, afirmou em nota considerar o médico "soberano no diagnóstico e tratamento".
A entidade disse também que seus afiliados não fazem restrição ao acesso aos serviços, como internações e exames, "desde que estejam previstos nas coberturas contratuais".
A Cassi, citada como um dos quatro piores planos, disse que as glosas, item em que aparece com o maior índice de insatisfação, "ocorrem com base em não conformidades dos procedimentos definidos como padrão da empresa".
Na equação entre médico e plano, paciente é peça mais frágil
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
Não é simples a equação que envolve planos de saúde e seus prestadores de serviços. Novas tecnologias em medicina surgem a cada ano, aumentando substancialmente os custos em saúde.
Impedidas de cobrar mais dos clientes, já que os aumentos são regulados pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), as operadoras buscam economizar pagando menos a hospitais e médicos. Outra estratégia tem sido abrir hospitais próprios para ampliar a receita.
Do ponto de vista de remuneração, não há dúvida de que os honorários médicos estão defasados. Desde 2004 não há reajuste das operadoras. Por consulta, os médicos recebem de R$ 15 a R$ 49.
As operadoras, por sua vez, argumentam que os médicos praticam muitas consultas e procedimentos para aumentar o ganho.
Um exemplo é a área de órteses e próteses. São muitas as histórias de médicos que indicam um produto (prótese de quadril, por exemplo) e, em troca, ganham comissões da indústria. E quem paga a conta é o plano.
Por outro lado, os médicos argumentam que a responsabilidade pela eficácia de um procedimento é do profissional, que não pode submeter sua decisão ao plano.
Algumas operadoras já negociam diretamente com a indústria. E garantem que estão economizando muito na compra de materiais.
Outra proposta dos planos é o pagamento por desempenho. Bons médicos e hospitais teriam uma remuneração extra. Nos EUA, mais de 50% dos planos têm programas com contratos baseados na performance.
Por aqui, o assunto é polêmico e enfrenta resistência dos médicos. Mas a tendência é mundial. O desafio, porém, é garantir proteção à peça mais frágil desse quebra-cabeça: nós, os pacientes.
Fonte: Folha de S. Paulo
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